Brasil deixa Mapa da Fome: ActionAid defende políticas para que compromisso seja permanente
O relatório “O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo 2025” (SOFI), divulgado nesta segunda-feira (28) por cinco agências da ONU (FAO, FIDA, OMS, PMA e UNICEF), aponta leve melhora no quadro global — com a fome caindo de 8,5% para 8,2% da população mundial — e a saída do Brasil do Mapa da Fome. Neste contexto, uma importante conquista é alcançada, mas há de se manter vigilância e compromisso contínuo. Afinal, o cenário permanece crítico e marcado por profundas desigualdades.
Segundo o relatório, o Brasil atingiu pela segunda vez desde 2014 o patamar necessário para sair do Mapa da Fome: a subalimentação atingiu menos que 2,5% da população no período de 2022 a 2024. A redução também é significativa no índice de insegurança alimentar moderada ou severa, que caiu de 18,4% para 13,5% da população.
Francisco Menezes, consultor de políticas da ActionAid, afirma que o resultado reflete um conjunto de medidas importantes retomadas desde 2023, e alerta que o cenário exige compromisso permanente:
“Sair do Mapa da Fome é um avanço, mas não podemos comemorar como se a batalha estivesse vencida. Já estivemos fora antes e voltamos. O desafio agora é construir garantias para que isso não se repita. Isso significa políticas públicas duradouras, com recursos protegidos, voltadas às populações mais vulnerabilizadas e aos territórios mais atingidos pelas desigualdades sociais e pelos eventos climáticos extremos.”
No Brasil, os avanços recentes foram impulsionados por políticas públicas de transferência de renda, como a ampliação do Bolsa Família, e pela recuperação parcial dos níveis de emprego e renda, que permitiram a queda da pobreza extrema para 4,4% e da pobreza geral para 23% da população. Também foi essencial a reativação de políticas de segurança alimentar e nutricional no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN).
No entanto, os riscos de retrocesso são concretos. Eventos climáticos extremos — como inundações, secas e queimadas — seguem afetando a produção de alimentos e exigem políticas de adaptação estruturais e transformadoras. Além disso, a inflação de alimentos continua impactando fortemente as pessoas mais pobres, e o desmonte de orçamentos públicos em favor de emendas parlamentares pouco transparentes compromete a continuidade de programas essenciais.
“A fome tem cor, gênero e território. No Brasil e no mundo, são as mulheres negras, povos indígenas, comunidades rurais e periferias urbanas os mais atingidos pela insegurança alimentar. Para além de sair do Mapa da Fome, é preciso romper com as desigualdades que sustentam esse ciclo. Senão, estaremos sempre enxugando gelo”, pontua Menezes.
Os dados do SOFI reforçam que a insegurança alimentar é consequência direta de desigualdades estruturais. No Brasil, as mulheres negras são as mais impactadas pela fome, mesmo quando apresentam níveis de escolaridade iguais ou superiores aos dos homens. A persistência desse abismo social e econômico exige uma resposta coordenada do Estado, com políticas públicas sustentáveis e de longo prazo. Para a ActionAid, enfrentar a fome exige também enfrentar o racismo, o machismo e a concentração de renda, que historicamente excluem milhões de brasileiros do direito à alimentação adequada.
A ActionAid reforça que erradicar a fome passa por investimentos estruturais e contínuos em políticas públicas de educação, saúde, segurança alimentar e programas sociais voltados prioritariamente às populações mais vulnerabilizadas — especialmente mulheres negras, juventudes periféricas, comunidades tradicionais e agricultores familiares. Além disso, é fundamental adotar reformas na política tributária que garantam maior progressividade e redistribuição de recursos.
“É absolutamente necessário combater o abismo entre os grupos mais vulnerabilizados e aqueles que concentram renda. A destinação de recursos para políticas públicas precisa ser prioritária, nesse governo e nos próximos. Ao mesmo tempo, é urgente buscar justiça fiscal, com medidas que ampliem a contribuição dos mais ricos para a garantia de direitos sociais. Só assim o país conseguirá romper com o ciclo histórico da fome e da desigualdade”, conclui Menezes.
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